Quantas vezes ouvimos já que o futebol é coisa para rapazes? Ou que aquele amigo com a pontaria desafinada remata como uma menina? Pois é, o desporto-rei é, desde o início, um universo dominado por homens. Felizmente, o pontapé de saída para a mudança de paradigma já foi dado e a bola não dá sinais de querer abrandar. Esta é uma aposta segura: o futebol feminino chegou para ficar e vai continuar a somar pontos na próxima década. Mas nem sempre foi assim…
A história do futebol feminino
Precisamos de recuar mais de 100 anos para chegarmos à página de História que relata o primeiro grande fenómeno de popularidade do futebol feminino. Viaje connosco até à Grã Bretanha de 1914. Ora, quando rebenta a I Guerra Mundial, uma grande fatia da população masculina foi recrutada para os campos de batalha. Por sua vez, as mulheres acabaram por entrar em força nas fábricas, como operárias. Estava aberta a porta à emancipação.
Na época, muitas fábricas tinham as suas próprias equipas de futebol, um privilégio, até aí, exclusivo dos homens. Com a sua introdução na força de trabalho, as mulheres rapidamente começaram a disputar jogos de futebol nas instalações fabris, durante as pausas laborais e nos dias livres. Pouco tempo depois, em 1920, o fenómeno atingia um pico de popularidade: o jogo que opunha as Dick, Kerr’s Ladies FC às St Helens Ladies, no estádio do Everton, atraiu 53 mil pessoas às bancadas.
Contudo, em 1921, com a guerra terminada há três anos, as competições masculinas regressaram à normalidade e o novo fulgor do futebol feminino era visto como uma ameaça. Perante isto, a Federação Inglesa emitiu uma resolução em que defendia que “este desporto é muito pouco indicado para o sexo feminino e não deve, de forma alguma, ser encorajado”. O futebol feminino era, assim, banido dos estádios britânicos. Uma decisão que só viria a ser revogada 50 anos depois.
Qual o lugar da mulher… no onze?
O futebol jogado no feminino viu a sua afirmação ser-lhe dificultada em inúmeros momentos. No campeonato europeu de 1989, na Alemanha, a vitória valeu à equipa campeã um conjunto de chá. Já em 2004, Joseph Blatter, o então presidente da FIFA, defendeu que as jogadoras de futebol deviam usar calções mais curtos. Mas o paradigma tem mudado a olhos vistos.
Um pouco por todo o mundo, há cada vez mais campeonatos femininos competitivos, mais infraestruturas e programas de apoio ao desenvolvimento da modalidade. O número de mulheres que jogam futebol registou um aumento exponencial, passando de quatro milhões, em 2006, para 30 milhões. Além disso, o número de jogadoras profissionais duplicou nos últimos cinco anos. Há razões para otimismo.
Segundo um artigo de Salomé Marivoet, o aumento da prática desportiva feminina nos últimos anos deve-se, sobretudo, a uma mudança na relação entre os géneros, num universo ainda marcado pela dominação da cultura masculina. O futebol feminino veio mesmo para ficar, e Portugal não fica de fora.
O futebol feminino em Portugal
Acompanhando a tendência internacional – atente-se no sucesso do Mundial de Futebol Feminino de 2019 –, começa a sentir-se, em Portugal, a vontade de oferecer a esta modalidade uma maior centralidade. Com o crescimento do número de atletas federadas e com o surgimento de novas competições, abre-se a porta à competitividade, ao investimento e, claro, à atenção mediática.
Neste momento, o país já exporta talentos para os colossos europeus, como o Milan, o Manchester City ou o Lyon. Além disso, o recente investimento em equipas seniores profissionais, realizado pelo Sporting Clube de Braga, pelo Sporting Clube de Portugal e pelo Sport Lisboa e Benfica, revelou-se um passo fulcral na afirmação da modalidade no cenário desportivo nacional. Ainda assim, há muito caminho por trilhar.
Na Field, acreditamos que o futebol é um prazer que deve ser usufruído por todos. O único limite que interessa é mesmo o das quatro linhas.